segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Currículo Comum ou Currículo Adaptado?

Dentro do contexto da inclusão, a alteração do currículo é uma questão que vem sendo bastante discutida no ambiente escolar. Segundo Álvaro Marchesi, conceituado autor da série Desenvolvimento Psicológico e Educação, em seu terceiro livro ele fala da prática inclusiva e da diversificação do currículo.

A integração educativa baseia-se na manutenção de um currículo comum para todos os alunos. Os alunos com graves problemas de aprendizagem incorporam-se à escola para ter acesso, junto com seus colegas, a experiências similares de aprendizagem. A ênfase nos aspectos comuns da aprendizagem destaca o “aspecto mais rico e positivo das escolas inclusivas”.

Sabemos que os alunos não são iguais, a atenção às diferenças faz parte também das estratégias educativas que se assentam no respeito à individualidade de cada aluno. No caso dos alunos especiais, exige uma educação adaptada às suas possibilidades. O problema surge quando tais adaptações supõem a modificação do currículo comum. É difícil compatibilizar as duas demandas, visto que a primeira reforça a dimensão da igualdade e a segunda assinala a dimensão da diferença. Diante disto vemos que os caminhos mais óbvios para responder à diferença seguem exatamente por estratégias opostas. E como esses enfoques tão diferentes entre si, podem ser reconciliados de tal maneira que os currículos sejam comuns e ao mesmo tempo múltiplos, as escolas sejam inclusivas e  seletivas, e as aulas proporcionem experiências de aprendizagem que sejam as mesmas para todos mas diferentes para cada um.

Este dilema, não se refere apenas a educação especial, mas esta presente no enfoque mais global do sistema educacional. Por exemplo um currículo centrado fundamentalmente nos conteúdos conceituais e nos aspectos mais acadêmicos, que propõe sistemas de avaliação baseados na superação de um nível formativo igual para todos, lança ao fracasso os alunos com mais dificuldades para avançar nesses âmbitos. Os currículos mais equilibrados, nos quais o desenvolvimento social e pessoal também tem importância e em que a avaliação seja feita em função do progresso de cada aluno, facilitam a integração dos alunos. Vimos o quanto é difícil resolver este problema, tanto para direção quanto para os professores. Seria necessário um equilíbrio entre as demandas que parecem contraditórias, mas como se alcança esse equilíbrio?

Um estudo realizado por Norwich sobre este dilema, obteve diversas respostas, porém a que mais se destacou foi a seguinte:

“Proporcionar tantas experiências iguais de aprendizagem quanto possível, ao mesmo tempo em que se levam em conta as necessidades individuais. Manter um equilíbrio. Isto é difícil e requer compromisso e recursos.”

Mesmo a resposta sendo excessivamente genérica, é preciso analisar de forma minuciosa os componentes do currículo e estabelecer que elementos devem ser comuns para todos os alunos.

Assim existe um amplo leque de adaptações curriculares: desde sua não existência opção 1, até o máximo de modificação, que chega até ao ponto de mudar os objetivos gerais da etapa educativa, opção 7. Entre as duas existem diferentes possibilidades, conforme se priorizar os elementos comuns ou os diferenciais.

A decisão a ser tomada sobre as adaptações devem levar em conta outros fatores. Entre eles é preciso destacar a metodologia que se utiliza o sistema de organizar os apoios dos alunos e os meios empregados para facilitar ao aluno o acesso ao currículo (Quadro 2)

Nesse enfoque, a ênfase a um currículo mais comum ou mais diversificação não se manifesta apenas levando em conta os elementos incluídos no Quadro 1, mas também é preciso considerar os fatores incluídos no Quadro 2. Que seja por exemplo a opção 4, na qual os objetivos da etapa, as áreas curriculares e os objetivos de cada área se mantêm comuns para todos os alunos, enquanto para alguns se modificam os conteúdos, os critérios de avaliação e os métodos pedagógicos. Nessa suposição seria preciso analisar como se põe em prática tal alternativa.


Quadro 1- Diferentes alternativas sobre os aspectos comuns e diferenciais no desenvolvimento do currículo*



Objetivo da Etapa
Áreas
Objetivos de Área
Conteúdos
Critérios de Avaliação
Métodos
1
C
C
C
C
C
C
2
C
C
C
C
C
D
3
C
C
C
C
D
D
4
C
C
C
D
D
D
5
C
C
D
D
D
D
6
C
D
D
D
D
D
7
D
D
D
D
D
D

*(C = Comum para todos. D = Diferente para alguns)


Quadro 2- Fatores que influem nos aspectos comuns ou diferenciais do ensino



Método
Apoio
Acesso
Comum
Níveis múltiplos
Cooperação
Tutoria
Compartilhado
Novos sistemas de signos, sistemas alternativos, etc.
Diferenciado
Atenção Individualizada
Específico
Não há adaptações de acesso


Se essas adaptações metodológicas e dos conteúdos se traduzem em que os principais conhecimentos sejam apresentados com nível de profundidade distinto, em que os alunos cooperem uns com os outros, em que os professores de apoio trabalhem junto com o professor titular no atendimento a todos os alunos, e que se proporcione aos alunos com graves problemas de aprendizagem novos sistemas de acesso ao currículo, a ênfase situa-se claramente na dimensão do ensino comum. Se ao contrário disso, limitar o aluno com mais dificuldades de forma isolada aos conteúdos específicos e o professor de apoio atender somente a este aluno, enfatiza-se um ensino diferenciador.

Essas reflexões ressaltam a difícil articulação entre um ensino comum pra todos os alunos e um ensino que leve em conta as possibilidades de aprendizagem de cada um deles.
A articulação entre o comum e o especializado não depende das demandas educativas apresentadas pelo aluno, mas das decisões que os professores de uma escola adotam para abordar, dentro de um mesmo grupo, as situações diversas de aprendizagem que seus alunos apresentam.